Mariana, 1 mês depois: lições da tragédia para a gestão de riscos
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- Rodrigo Amaral
- 9 de dezembro de 2015
- Sem categoria
Mesmo que as causas do rompimento da barragem ainda estejam sendo investigadas, episódio traz várias lições para as empresas brasileiras
Pouco mais de um mês após a tragédia de Mariana (MG), ainda não se sabe com certeza absoluta quais as foram as causas do rompimento da barragem do Fundão, que matou ao menos 13 pessoas e destruiu o distrito de Bento Rodrigues.
Mas o evento que, além de uma tragédia humana, se coloca como o maior desastre ambiental da história do Brasil já deixou algumas importantes lições para as empresas no que diz respeito à importância de levar a sério a gestão de seus riscos.
Isso tudo deixando de lado a parte técnica do desastre. Especialistas apontam várias causas possíveis, desde a utilização de métodos de construção já deixados de lado em outros países até possíveis vistas grossas a sinais de alarme para o risco de rompimento.
Mesmo antes de os laudos definitivos chegarem, no entanto, já se pode tirar algumas lições importantes, que nenhum gestor de risco deve ignorar.
Além das empresas
A mais importante delas é que a gestão de riscos empresariais não interessa apenas às empresas, mas à sociedade como um todo.
O objetivo primordial do gestor de risco é trabalhar em favor da garantia do balanço de sua empresa. Porém isso se faz batalhando por medidas que muitas vezes têm um alcance muito mais amplo do que esse.
A gestão de riscos de rompimento de barragens é um exemplo que se tornou, tristemente, mais do que óbvio neste último mês. Mas está longe de ser o único.
Em sua ânsia de maximizar o lucro, os máximos administradores de empresas muitas vezes podem adotar medidas que comprometem o meio ambiente ou causam riscos à saúde dos consumidores, ou ainda engajar-se em condutas de legalidade duvidosa.
São atos que cada vez mais as empresas brasileiras estão tendo que responder na Justiça, ao mercado financeiro e à opinião pública por seu amplo alcance econômico e social.
Da mesma maneira autoridades, investidores, imprensa e redes sociais estão mostrando um apetite insaciável por cobrar responsabilidades quando tais situações ocorrem.
Conseqüências para o bolso
Se as dimensões humana e ambiental da tragédia de Mariana não serviram de argumento suficiente para a necessidade de reforçar a gestão de riscos das empresas, quem sabe a situação muda quando se invoca órgão mais sensível de diretores e acionistas – sabidamente, o bolso.
Nesta semana, um escritório de advocacia entrou com uma pedido de ação coletiva nos EUA de investidores contra a Vale, uma das acionistas da Samarco, para ressarcir o prejuízo sofrido por acionistas da empresa como resultado do desastre.
Um dos argumentos mais interessantes utilizados pelos advogados é que a Vale prestou informações falsas ao mercado ao afirmar que possuía programas de gestão de riscos sanitários, ambientais e de segurança.
De acordo com a Rosen Law Firm, a Vale e seus mais altos executivos “fizeram afirmações falsas e/ou enganosas e/ou deixaram de revelar que: (1) o acidente do rompimento da Barragem do Fundão resultou na liberação de resídos tóxicos; (2) a Vale tinha um contrato com a Samarco que lhe permitia depositar resíduos de minério de ferro de suas usinas de tratamento da mina Alegria, da Vale, na Barragem do Fundão; (3) os programas e procedimentos da Vale para mitigar programas e procedimentos meio-ambientais, sanitários e de segurança eram inadequados; (…)”.
Com isso, segue o argumento, os investidores foram surpreendidos por queda nos valores das ações da Vale que não tinham como prever.
Pode-se argumentar que as ações coletivas nos Estados Unidos se tornaram uma verdadeira indústria, em que advogados oportunistas buscam quaisquer oportunidades para iniciar um processo. Mas o risco de condenação pelas cortes americanas neste tipo de ação é considerável. Então o melhor negócio é não deixar muita margem para que isso aconteça.
Juntem-se as indenizações por responsabilidade civil e responsabilidade ambiental geradas pelo acidente, além das várias multas federais e estaduais que serão aplicadas no Brasil, e é possível ter uma ideia, ainda que extrema, do quanto dinheiro uma gestão de riscos bem-feita pode economizar para a empresa. No mínimo ajudaria a enfraquecer o tipo de argumento usado pela Rosen Law (e ao menos dois outros escritórios).
Por outro lado, com a falha de autoridades e as próprias empresas em desenvolver a gestão de riscos, não deixa de ser salutar que investidores ativistas façam pressão neste sentido.
Gestão de crise
Outra lição é que os planos de gestão de crises elaborados pelas empresas devem partir do pressuposto de que uma emergência pode de fato acontecer.
Isso pode soar óbvio, mas a monumental falha do plano de emergência da Samarco em Bento Rodrigues passou a impressão de que a empresa havia elaborado um documento capaz de convencer burocratas, mas pouco adequado para funcionar na eventualidade de um evento real.
A falta de elementos simples, que vão desde a falta de uma sirene para alertar os moradores das redondezas até a demora para avisar as autoridades competentes, certamente não colaboraram em nada para reduzir a gravidade de tragédia.
O desastre também colocou em evidência a capacidade fiscalizadora do Estado brasileiro. A cobertura da mídia mostrou que, sem recursos e sem pessoal, os departamentos responsáveis pela implementação de regras vitais para a sociedade, como a segurança de barragens, encontram-se muito aquém desta tarefa.
Para as empresas, a lição neste caso é que a gestão de riscos não pode se resumir a obedecer regulamentações. É necessário avaliar criteriosamente os riscos a que a empresa está exposta em trabalhar em sua mitigação, ainda que não estejam previstos em nenhum tipo de lei.
É preciso comunicar
Há ainda a questão da gestão da comunicação com a sociedade após um evento, catastrófico ou não, e seus efeitos .
A opinião pública ficou com a impressão de que a Vale, ainda que sendo coproprietária da Samarco, está mais preocupada em se esquivar da responsabilidade legal pela tragédia do que em fazer algo para consertar a situação.
A impressão pode ser até equivocada, mas no fim é o que conta em termos de reputação da empresa.
A tentativa de diretores da companhia de minimizar os danos ecológicos causados pela tragédia na bacia do Rio Doce, durante entrevista em Nova York, tampouco ajudou a elevar a reputação da companhia após o caso. Afirmações desairosas contra os botequins, certamente bem mais populares do que multinacionais de mineração, só contribuem para piorar a situação.
Especialistas dizem que as empresas ainda gestionam mal o risco de reputação, e a tragédia de Mariana, assim como a Operação Lava Jato, ajudaram a tornar este tema ainda mais premente.
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