Caso Oi gera perda catastrófica em segmento já marcado por dificuldades
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- Oscar Röcker Netto
- 30 de junho de 2016
- Sem categoria
Crise econômica fez aumentar sinistralidade e taxas no seguro de crédito; apólices se tornam mais restritivas
O mercado de seguro de crédito nem precisava de um caso espalhafatoso para coroar a situação delicada que vem enfrentando desde meados de 2015. Mas ele veio no dia 20 de junho com o pedido de recuperação judicial da Oi — o maior já feito no país, envolvendo dívidas de R$ 65,4 bilhões, um valor equivalente à soma dos dez maiores pedidos anteriores.
De acordo com Luciano Mendonça, diretor comercial, de subscrição e marketing da Euler Hermes, especializada no seguro de crédito, trata-se de um sinistro catastrófico, no qual há, segundo relatos no mercado, uma seguradora exposta em mais de R$ 70 milhões, e outra, em R$ 12 milhões.
Esses valores altos ocorrem mesmo depois de o mercado segurador ter diminuído sua exposição ao risco, não só na Oi — cujo histórico de problemas se acumula desde sua criação — como no mercado como um todo.
A razão é o aumento dos sinistros, que impactou a saúde da carteira. Em 2014, a sinistralidade fechou em 68%, pulou para 124% no final de 2015 e caiu para 100% nos cinco primeiros meses do ano — nesse mesmo período de 2015, estava em 85%.
Esses números levam em conta sete tipos de seguro que fazem parte do ramo de crédito listados no Sistema de Estatísticas da Susep. Eles mostram também que o volume de sinistros ocorridos entre janeiro e maio deste ano bateu em R$ 316 milhões, contra R$ 212 milhões no mesmo período de 2015, uma alta de 49% .
Num cenário de aumento dos pedidos de recuperação, inadimplência, prolongamento de prazos de pagamento e da insolvência de empresas, as apólices tornaram-se mais restritivas e as taxas subiram para o segurado entre 10% e 30%, de acordo com a corretora Lockton.
“Ainda não se vê luz no fim do túnel”, diz Mendonça. “Mas a gente espera que já tenha batido no fundo do poço. As empresas [clientes] pararam de afundar.”
Se ainda não há muito o que comemorar, ele espera que a tendência de queda da sinistralidade apresentada nos últimos meses se confirme. “Mas ninguém está com espaço para baixar a guarda.”
A guarda alta nas seguradoras significou aumento das franquias e da participação do segurado no pagamento das indenizações, além de aplicação do chamado malus (prêmio adicional aplicado a riscos que se mostram muito desfavoráveis ao segurador, acionado a partir de determinado nível de sinistralidade da apólice) e de um acompanhamento mais rigoroso do perfil de risco de cada cliente.
“As seguradoras hoje estão preferindo apresentar condições de compartilhamento dos riscos”, diz Franklin Nogueira, superintendente da divisão internacional da Lockton.
“Houve também restrição a determinados setores”, afirma Mendonça, citando construção, metais e varejo. A Lockton inclui ainda aqueles mais sensíveis à variação cambial, como informática, química, petroquímica, e os que dependem de crédito, como o automotivo e imobiliário.
Crise para todos os gostos
A situação é decorrente principalmente da crise econômica, agravada pela política.
Segundo a Serasa Experian, o primeiro quadrimestre deste ano registrou crescimento de 97,6% dos pedidos de recuperação judicial de empresas (571 casos), em relação ao mesmo período do ano anterior. É a maior alta neste período desde 2006, quando passou a vigorar a Nova Lei de Falências no Brasil. Em 2015, o número já tinha subido 55%.
Nogueira diz que a partir de 2014 os pedidos de recuperação, até então mais concentrados em empresas de pequeno e médio porte, se espalharam também para as grandes. “O caso da Oi não reflete no apetite das seguradoras, mas serve de alerta para a política de crédito das empresas”, avalia ele.
Além da crise econômica, grandes empresas que entraram em recuperação judicial estão envolvidas em desvios apurados na Lava Jato. Por isso, companhias com compliance considerado frágil também passaram a sofrer mais restrições, dizem os especialistas.
A lista das dez maiores dívidas vinculadas a pedidos de recuperação judicial inclui a OAS, Sete Brasil, Abengoa, Schahim e OGX. “O caso da Oi é complexo, teve muita política, mas do ponto de vista das seguradoras é mais do mesmo”, compara Nogueira.
Em outro efeito sintomático da situação do país, Mendonça cita o crescente aumento de empresas insolventes. Segundo ele, era raro ocorrer sinistro de crédito por este motivo. “Mas nos últimos meses as insolvências foram causa de aproximadamente 25% das indenizações.”
Nogueira nota que houve ainda o prolongamento dos atrasos. “Nossos clientes reportam que os atrasos que eram de 60 dias estão agora em 90 ou até 120.” Situação que exige reforço no capital de giro das companhias, completa.
Fôlego
De acordo com o diretor da Euler Hermes, as seguradoras têm provisões suficientes para estes tempos bicudos, mas trabalhar por longos períodos (dois anos seguidos, por exemplo) com sinistralidade na casa de 100% mina a carteira e em casos mais graves pode exigir capitalização de suas matrizes.
Em um artigo corporativo veiculado em abril, a Lockton avaliou que “apesar do momento adverso, há boa oferta de capacidade e produto no mercado brasileiro, com seguradoras oferecendo versões que vão desde apólices tradicionais até soluções para operações estruturadas para desconto de recebíveis”. Segundo a corretora, isso tem evitado uma subida maior dos preços de seguros.
O documento, no entanto, aponta que o cenário para os próximos 18 meses não dá “expectativa de alívio para as equipes de crédito e financeira das empresas”.
Para Franklin Nogueira, os problemas persistirão “sem distinção de setores”. A desanimar perspectivas mais otimistas ele lembra de alguns dados recentes da Serasa Experian: “Há 4,4 milhões de empresas negativadas no país. O total de dívidas soma R$ 105 bilhões. A inadimplência vai ser uma constante este ano”.
“Numa situação em que as empresas estão num cenário com clientes atrasando mais [pagamentos] e com prazos mais alongados, o seguro de crédito, mesmo com riscos compartilhados, é uma solução plausível e necessária para as empresas garantirem sua solvência”, defende.
Gangorra limitada
Com o mercado interno em má situação, o seguro de crédito também mostra o movimento das empresas brasileiras em busca de alternativas para seus negócios. O aumento dos prêmios deste tipo de seguro voltado à exportação cresceu, diz Mendonça.
Enquanto os prêmios dos seguros de crédito no mercado doméstico tiveram retração de 16% (abril de 2016 contra abril de 2015), os voltados à exportação subiram 62% entre as seguradoras, também motivados pelo câmbio mais favorável. “Quem tinha carteira de exportação pequena pensa em expandir e quem não tinha está buscando possibilidades no mercado externo — e cotando seguro.”
De acordo com Mendonça, esse crescimento, entretanto, não consegue compensar as perdas domésticas, já que a exportação representa, historicamente, cerca de 10% a 15% do total dos seguros de crédito.
A queda nos prêmios de seguro de crédito (doméstico mais exportação) emitidos em abril foi de 10% em relação ao mesmo mês do ano passado, de acordo com o executivo.
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