Barragem de Mariana era do tipo mais barato e arriscado, diz especialista
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- Oscar Röcker Netto
- 7 de dezembro de 2015
- Sem categoria
Segundo Dinésio Franco, método construtivo de barragem que rompeu tem restrições; há maior probabilidade de riscos imponderáveis
A barragem da Samarco que rompeu em Mariana (MG) é de um tipo mais barato, mais rápido e mais fácil de construir, mas que embute mais riscos imponderáveis na sua operação, de acordo com o especialista em barragens de minério Dinésio Franco, que trabalha neste setor há 39 anos e é diretor de empresa mineira de projetos e consultoria que leva seu nome.
A metodologia de projeto e construção de barragens conhecida como “alteamento de montante” é usada numa minoria — cerca de 15% — das barragens de rejeitos em operação, calcula ele, tendo em vista que poucos rejeitos permitem o procedimento.
A estrutura pode apresentar problemas não facilmente identificáveis, afirma Franco. Dessa forma, portanto, o rompimento de forma surpreendente, sem sinais prévios, é um risco inerente a este tipo de barragem, diz o especialista, lembrando que ele é bastante utilizado no Chile.
Fora o caso da Samarco, outras barragens de rejeitos construídas com a metodologia já se romperam no quadrilátero ferrífero mineiro. Foram os casos das minas de Fernandinho, em 1986, de Rio Verde, em 2001, e de Herculano, em 2014. “Há restrições ao uso e são necessários muitos cuidados. A parte técnica tenta cercar todos os imponderáveis, mas há mais riscos”, disse ele em entrevista à Risco Seguro Brasil. “Depois dos revezes anteriores, esse acidente [da Samarco] é inadmissível.”
Levantamento obtido pelo jornal Folha de São Paulo, mostra que entre 1910 e 2010 em 40% dos 68 desastres graves com barragens que ocorreram no mundo as barragens eram do mesmo modelo do de Mariana.
Segundo Franco, a Samarco sempre foi exemplar na gestão da barragem, possuindo “equipe própria de qualidade inquestionável”, além de consultores especilistas. “A gestão é boa, mas houve falhas humanas. Não se pode atribuir o episódio a um ato de Deus. Não sei quais foram as falhas. Sem dúvida, acredito que a barragem estava sendo monitorada.”
De acordo com o engenheiro, os riscos imponderáveis ou de difícil detecção incluem, por exemplo, a variabilidade ou variação não mensurável de característica dos rejeitos, que são também materiais de construção, que por sua vez, tornam variável a eficiência da drenagem interna. “O rejeito de ferro possui argilas coloidais, que podem mudar a permeabilidade, a resistência, a forma de sedimentação, em resumo, podem mudar a permeabilidade e as características de resistência naquela estrutura.”
Nas barragens de concreto ou convencionais de terra é possível identificar problemas por meio visual ou de instrumentos diversos, tais como indicadores de níveis de água, piezômetros, marcos de recalques, entre outros. “Elas sempre mostram [os problemas] através de deformações, trincas, mudanças dos níveis internos”, diz Franco.
Momento de melhoria
Para o engenheiro, o desastre da Samarco vai resultar em melhorias na gestão das barragens. “Esse evento infeliz vai ser motivo para que as coisas mudem”, diz ele. “Acho muito esquisito esse negócio de que ‘há males que vêm pra bem’ — e neste caso não cabia tanto mal —, mas a gestão de projetos, de obras, de operação devem melhorar, inclusive para o próprio Rio Doce”.
Segundo ele, o desastre foi “a pá de cal” no rio, que já vinha com um processo de deterioração. “Eram 210 municípios lançando seus esgotos e efluentes industriais em seu leito há décadas. Daqui para frente vai ser tratado com outro olhar, quem sabe até melhor que antes.”
Modelo construtivo
Franco explica que a barragem de “alteamento de montante” é feita construindo-se uma pequena barragem inicial convencional, lançando-se os rejeitos na bacia de acumulação que formam uma espécie de praia, sobre a qual se constroem pequenos maciços, com o próprio rejeito ou com outros materiais. Assim, vão sendo erguidos pequenos maciços superpostos, até o limite considerado possível pelo projetista da estrutura. No final se tem uma série desses maciços (de mais ou menos cinco metros cada), como se fossem degraus, fazendo com que a estrutura seja mais uma um empilhamento do que uma barragem propriamente dita.
“As rupturas registradas no quadrilátero ferrífero de Minas Gerais não deveriam entrar nos anais como ‘eventos de ruptura de barragens de rejeitos’, mas como eventos de ‘rupturas de pilhas de rejeitos’ não drenadas”, diz o consultor. “As estruturas de barragens estão sendo injustiçadas.”
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