Resseguro quer menos imposto para criar polo internacional no Brasil
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- Oscar Röcker Netto, no Rio de Janeiro
- 11 de abril de 2016
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Com apoio da Susep, projeto pede flexibilização de regras tributárias e trabalhistas para atrair para o país negócios do exterior

O desafio: convencer o governo de que vale a pena mudar algumas regras no setor. O benefício: dobrar o tamanho do mercado de resseguros no Brasil, transformando o país num exportador de resseguro. Uma (grande) dificuldade: fazer isso avançar em meio a crise política e econômica que trava o país. Uma (boa) vantagem: já ter um projeto estruturado que poderá ser negociado quando a poeira da crise baixar.
Com essa situação, o projeto de criação de um Polo de Resseguros no Brasil deverá ser encaminhado para análise do Ministério da Fazenda até junho deste ano. O documento é resultado de um grupo de trabalho liderado pela Federação Nacional de Resseguradoras (Fenaber), que estruturou propostas nas áreas tributária, regulatória e trabalhista.
O documento pede isonomia tributária às condições internacionais para resseguradoras locais que captem resseguros no exterior e flexibilização das regras de investimento para essas empresas. E traz ainda questões a serem aprofundadas, como mudanças jurídicas para transferência de riscos de resseguro para o mercado de capitais local e a criação de uma zona especial de exportação de resseguro — dois temas que deverão ser objeto de estudo específico.
O foco prioritário no curto prazo é na redução dos impostos, o que é considerado fundamental para dar competitividade às empresas locais.
“Queremos brigar de igual para igual com os centros de seguro e resseguro do mundo”, disse Flavio Girão, diretor de Autorizações da Susep, em sua apresentação no 5º Encontro de Resseguro do Rio de Janeiro.
Girão tocou em alguns temas que soam como música para o mercado, como a flexibilização de regras. “A regulamentação para o Polo de Resseguros pode ser diferente da aplicada às operações geradas internamente”, afirmou.
“Quando se fala em cessão de resseguros gerados lá fora, de atrair esse risco para o Brasil, a gente está falando de um mercado que ainda é incipiente e de seguradores e segurados de fora do nosso país. Então, a gente pode ser um pouquinho mais abusado.”
Ousadia
Como se trata de um projeto que ainda precisa ser aprovado pelo governo e implementado, Girão fez questão de ressalvar as possibilidades de flexibilização para este setor.

“Pode, não quer dizer que vai ser”, afirmou, lembrando que o timing do agente regulador, por características próprias, nem sempre tem a velocidade que o mercado gostaria.
De qualquer forma, ele entende que uma certa ousadia federal com este projeto tem potencial para apresentar reflexos positivos também no desenvolvimento do mercado interno.
“O polo pode ser um laboratório para o mercado interno. Por que não introduzir no mercado local aquilo que a gente concluir que deu certo para a regulação do polo? Vamos ter o privilégio de ter dois mercados rodando em paralelo.”
O superintendente da Susep, Roberto Westenberger, reforça esse potencial: “Espero que o polo sinalize experiências, principalmente no setor regulatório, alinhadas à regulação internacional”.
Na lista de flexibilizações possíveis Girão elencou as regras de clausulado, retenção mínima, aplicação dos investimentos, provisionamento, capital baseado em risco e regras de solvência. “Talvez [as empresas] precisem de ainda mais liberdade na hora de investir seus ativos”, exemplificou.
Westenberger apontou ainda a necessidade de que os movimentos para implantação sejam rápidos, haja vista a concorrência. “A Argentina está se estruturando e é potencial concorrente, como são Panamá, Porto Rico e Colômbia. Não importa tanto, neste momento, o cenário de crise econômica do Brasil. Quem pensa de forma macroeconômica pensa a longo prazo.”
A postura da Susep tende a pesar na avaliação que o ministério fará do projeto, já que se trata de uma autarquia a ele vinculada.
O que está em jogo
A embalar as mudanças está o fato de que o Brasil representa hoje quase a metade dos prêmios de seguros da América Latina, mas apenas 16% dos de resseguros.
O mercado de resseguro brasileiro hoje é de US$ 2,5 bilhões, e o da América Latina, US$ 21 bilhões. O estudo aponta que, no cenário pessimista, o polo atrairá 10% dos prêmios latino-americanos e o mercado nacional crescerá 53%. No cenário considerado realista, a atração fica em 25% dos prêmios com incremento de 131% do mercado nacional. No cenário otimista, os resseguros crescem 210% no Brasil com atração de 40% dos prêmios latinos.
O estudo aponta também que os números podem ser ainda mais promissores com atração de resseguros da África (onde já há resseguradoras locais atuando) e mercados emergentes da China, Coreia do Sul, Índia e Oriente Médio.
“O potencial financeiro é muito grande. Estamos bem posicionados para sermos exportadores de resseguros”, avalia Rodrigo Botti, diretor da resseguradora local Terra Brasis.
Impostos
Tal potencial vai ser usado para convencer o governo de que vale a pena reduzir impostos para viabilizar o polo — o que significará maior arrecadação frente ao que se tem hoje.
O “regime tributário diferenciado para resseguradoras” é um ponto fundamental. Segundo Girão, fica difícil para as empresas brasileiras competirem neste mercado com alíquotas de imposto de 45%, contra 15% de outros países.
Trata-se, no entanto, de um dos nós a ser desatado junto ao governo. A Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece que benefícios fiscais aplicados num setor precisam ser compensados.
Os defensores da ideia alegam que a arrecadação de impostos hoje com “exportação de resseguro” é muito pequena e que a ampliação deste setor significará ampliação dos impostos para o governo. “Não há renúncia porque o mercado [exportador de resseguro] é muito pequeno hoje”, diz João Marcelo dos Santos, advogado especialista do escritório Santos Beviláqua.
De acordo com o documento a ser apresentado ao ministério, polos de resseguro recentes — como o de Bermudas, Hong Kong, Guernsey e o Estado americano de Vermont— trabalham com carga tributária perto de zero. Já os centros tradicionais de resseguros, como Alemanha, Suíça e Inglaterra, têm reduzido a carga tributária das instituições financeiras, tentando manter competitividade de seu mercado. “Em contrapartida, desde a crise financeira de 2008 o Brasil tem aumentado a carga tributária sobre instituições financeiras (bancos, seguradoras e resseguradoras locais)”, aponta o documento.
O projeto pede alterações no Imposto de Renda Pessoa Jurídica, Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL), Juros sobre Capital Próprio (JCP), PIS e Cofins.
A proposta para o IR/CSLL é trabalhar uma alíquota ponderada, levando-se em conta o volume de prêmios vindo do exterior (com menos imposto).
E a crise?
Os especialistas que apresentaram o projeto no 5º Encontro de Resseguro reconhecem que a crise política é um fator importante que atrapalha o encaminhamento do projeto, principalmente levando-se em conta que para alterar ou criar leis é preciso lançar mão da política.
Eles avaliam, no entanto, que é melhor começar a trabalhar agora na implementação das medidas, mesmo que os frutos vejam a ser colhidos mais para a frente.
“No curto prazo, o cenário é muito ruim, mas no longo prazo sou otimista”, disse Santos. “É um complicador, no momento parece até piada tratar disso, mas já passamos por outras fases até mais conturbadas que essa”, avaliou Flavio Girão. Concordando com ambos, Botti disse: “Tem muita coisa que precisamos começar a trabalhar já”.
“Existe uma grande disposição de trabalhar [este projeto]. A Fenaber está trabalhando neste sentido, a Susep vem apoiando… Estamos num momento [político] complexo, mas temos de estar prontos para o momento em que abrir uma janela e a gente possa implementar essas medidas”, afirmou Santos.
Histórico
A criação do Polo de Resseguros vem sendo aventada pelo mercado desde 2008, quando se abriu o mercado de resseguros no Brasil — até então monopólio do IRB. Até agora, entretanto, nunca decolou para valer.
Trabalhou-se a ideia de criar um polo no Rio de Janeiro. A ideia agora é que o polo valha para todo país. “Precisamos botar a ideia em prática”, disse Girão. “Oxalá tudo dê certo.”
Mesmo diante das regras atuais, consideradas um forte limitador competitivo, as resseguradoras locais vêm obtendo expansão significativa no volume de prêmios de resseguros obtidos no exterior.
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