Caso Volkswagen traz à tona potencial de danos de uma crise de reputação
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- Rodrigo Amaral
- 25 de setembro de 2015
- Sem categoria
Um dos mais sérios e intangíveis riscos para qualquer empresa exige resposta rápida e transparente, mas recuperação pode levar anos. Estimativa de perdas com escândalo chega a até US$ 25 bi
O escândalo dos carros a diesel fabricados pela Volkswagen colocam em evidência uma das mais sérias e menos tangíveis ameaças enfrentadas pelas empresas hoje em dia: o risco de reputação. E também a necessidade de implementar planos de emergência para gerir crises deste tipo.
A revelação de que a empresa alemã trapaceou durante testes de controle de emissão de gases nos Estados Unidos terá consequências legais e econômicas capazes de causar perdas estimadas entre US$ 10 bilhões e US$ 25 bilhões, segundo o banco suíço Julius Baer.
Além disso, as ações da Volkswagen chegaram a perder 40% de seu valor após a revelação do escândalo pela EPA, a agência ambiental norte-americana.
Ainda mais duradouro, porém, pode ser o estrago causado à reputação da companhia nos Estados Unidos e no resto do mundo após décadas construindo uma imagem corporativa.
Na última semana, jornais, sites de internet e noticiários de TV abriram espaço para consumidores e analistas expressarem seu desgosto com as práticas da montadora — não faltaram candidatos para assumir o microfone.
“Havia uma época em que a Volkswagem era uma empresa que nos legou carros icônicos como o Beetle e a microônibus flower-power”, disse Ed Mierzwinski, o diretor do Programa de Consumidores da US PIRG, uma influente federação de ONGs de ativismo local. “Mas agora Volkswagen é apenas uma grande trapaceira.”
Não só consumidores expuseram sua insatisfação. Os investidores ressaltaram que a imagem da empresa alemã sairá severamente prejudicada pelo escândalo.
“Os resultados [do grupo Volkswagen] também serão afetados, já que a percepção das marcas VW e Audi deve ser severamente danificada”, afirmou Patrik Lang, chefe de área de pesquisa de ações no Julius Baer. Ele acredita que o impacto será sentido na forma de menor capacidade de definir os preços dos automóveis (ou seja, na necessidade de dar descontos para convencer os clientes a comprar seus carros) e perda de mercado.
Já a Vigeo, uma agência de rating que avalia a governança corporativa das empresas, rebaixou a nota da Volkswagen, em boa medida devido à mudança de percepção que se tem da empresa como boa cidadã corporativa.
“Estes eventos, de uma severidade extrema, sublinham como é urgente levar em conta as opiniões e os escores de rating social na avaliação de performance dos negócios”, disse Fouad Benseddik, diretor da Vigeo.
Gestão de crise
Comentários como esses, que foram amplamente reproduzidos pela mídia norte-americana e internacional, constituem o pesadelo de qualquer diretor de marketing que se preze.
Mas também ajudam a mostrar a importância para as empresas de estabelecer planos para reagir imediatamente a uma crise de reputação dessas proporções.
Em um mundo em que as notícias fluem sem interrupção a uma velocidade arrasadora, a velha tática de negar até o final e acionar o advogado tem poucas chances de evitar a deterioração da marca da empresa em caso de má conduta.
O problema já é bastante sério quando as alegações não são verdadeiras e podem ser facilmente negadas. No caso de irregularidades comprovadas, a reação precisa ser coerente, rápida e consistente, de acordo com especialistas.
“A reputação de uma empresa está baseada em confiança”, diz Kate Brader, diretora da unidade americana da Regester Larkin, uma consultoria de imagem baseada em Londres.
“Confiança está relacionada com o que as pessoas podem fazer pela empresa, com a possibilidade de elas comprarem suas ações, defenderem suas posições junto ao governo, ou mesmo adquirirem seus produtos.”
A principal preocupação de um sistema de gestão de crise de imagem deve ser portanto o restabelecimento da confiança que a opinião pública tinha na empresa antes do evento.
Uma das formas de fazer isso é deixar claro que a organização não aceita os comportamentos denunciados e está fazendo o possível para punir os responsáveis.
Em casos extremos, é o efeito que se quer passar com a demissão do principal executivo, como no caso do afastamento de Martin Winterkorn do cargo de CEO da Volkswagen. Ou as cenas de humilhação pública às vezes protagonizadas por altos dirigentes de empresas japonesas acusadas de más práticas.
Transparência
A gestão do problema, no entanto, também passa por adotar uma postura de humildade, admitir os erros e enfatizar a disposição da empresa de corrigir os erros cometidos.
“Especialmente em casos de suposta má-fé, fraude ou quebra de confiança, a empresa precisa reagir de forma transparente e se engajar com o tema”, afirma Brader.
Ela observa que uma postura apropriada não precisa ser improvisada no arrepio da crise. Uma empresa organizada quase nunca é surpreendida pela publicação de supostas irregularidades, pois terá sido capaz de ter conhecimento prévio, por meio de canais com as autoridades de investigação, denúncias internas e monitoramento constante da mídia e das redes sociais.
A preparação anterior à eclosão da crise também supõe o cultivo de relacionamento com meios de comunicação-chave para seus negócios, explica Brader.
Mãos à obra
Uma vez que estoura a crise, é necessário realizar uma rápida avaliação do potencial dano que ela pode causar. “Eventos de alta gravidade exigem a mobilização de recursos extraordinários e o envolvimento dos principais líderes da empresa”, diz a especialista.
O próximo passo é a definição da equipe que vai lidar com a crise. Especialistas como a consultora americana Melissa Agnes recomendam que as empresas designem uma equipe que fique em alerta permanente para o caso de uma crise de imagem.
Isso requer escolher, entre seus executivos e funcionários, um líder de gestão de crises que tenha total autonomia para tomar decisões operacionais.
Esta pessoa não deve ser necessariamente o CEO da empresa. Um dos objetivos de indicar um gestor da crise com poder de decisão é justamente liberar o CEO para tomar medidas de caráter estratégico.
Outros membros incluem um analista de mídia e redes sociais, um especialista na elaboração de conteúdos para documentar o caso e um gerente de relações com as comunidades afetadas pelos eventos.
Ademais, funcionários da empresa com conhecimentos especializados devem ser engajados de acordo com a natureza da crise. Se os aspectos legais são os mais relevantes, membros da equipe jurídica deve ser chamada a participar. Se são aspectos técnicos, é bom ter um engenheiro ou químico por perto a fim de evitar erros na comunicação.
“O mais importante é que os responsáveis por lidar com a crise tenham a capacidade de adotar soluções criativas na medida em que o tema de desenvolve, especialmente nos mais altos níveis hierárquicos da empresa”, diz Brader.
A comunicação também deve ser adaptada a cada um dos grupos de stakeholders, ou pessoas que têm um interesse na empresa. A forma de se comunicar com os acionistas não é a mesma com que se fala com os funcionários, políticos, supervisores ou ONGs, explica Brader. A mensagem, porém, deve ser a mesma para todos.
Começar de novo
Um desafio final é quando termina o trabalho de apagar o incêndio e quando começa o seguinte, também vital, de reconstruir a imagem da empresa.
Brader afirma que a situação ideal é que investimentos de marketing na reconstrução da imagem comecem a ocorrer logo que a crise aconteça, ao mesmo tempo em que se tenta evitar que o problema se agrave. Mas são poucas as companhias que possuem os recursos necessários para tanto.
Os custos envolvidos na gestão de crises de imagem podem ser bastante elevados. Há coberturas de seguro para risco de reputação disponíveis no mercado internacional, mas seu uso ainda não está amplamente difundido.
É importante, porém, dar início a este trabalho o mais rapidamente possível. A reconstrução da imagem de uma empresa é uma tarefa que pode durar bastante tempo, até mesmo vários anos, se há pendências legais envolvidas, observa Brader.
De fato, uma nota divulgada nesta semana pelo Deutsche Bank lembrou que, nos anos 80, carros da Audi apresentaram problemas de aceleração nos Estados Unidos.
Depois disso, foi preciso passar mais de uma década para que a empresa, que também faz parte do grupo Volkswagen, retomasse os volumes de venda anteriores à revelação do problema.
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