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Surpresas, proteção e fraquezas no resseguro brasileiro

Rodrigo Protasio, CEO da JLT no Brasil.
Rodrigo Protasio, CEO da JLT no Brasil.

Creio que todos foram pegos de surpresa pelas novas regras e a decisão do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, de mudar as proteções do mercado local e as limitações para a operação de resseguros intragrupo.

As medidas mostram a intenção do governo em abrir mais o mercado a favor das seguradoras estrangeiras.

Com isso, no longo prazo o mercado local vai se enfraquecer, já que a tendência é que as empresas estrangeiras instaladas no Brasil procurem se ressegurar cada vez mais com suas matrizes. A tendência é que gradualmente as resseguradoras locais voltem a perder participação de mercado — e quem investiu aqui nos últimos anos para aproveitar a proteção garantida até então sairá prejudicado.

Agora, os seguradores e resseguradores estrangeiros poderão acessar em volume maior seus capitais no exterior e alavancar seus programas internacionais de resseguros.

Trata-se de uma competição desigual. As locais arcam, por exemplo, com uma carga tributária que é maior do que a encontrada no exterior. Têm, portanto, menos competitividade. Também não temos ainda uma mão de obra nas condições ideais de treinamento. Ou seja:  podemos vir a perder oportunidade e evidência no mercado ressegurador.

Defendo a abertura da economia. O Brasil é um país muito fechado. Mas a permissão de operação intragrupo vai levar a uma redução de prêmios no país. O mercado de resseguros é muito pequeno para servir como mola propulsora da economia brasileira.

Não acredito que o modelo de mercado pré-resolução 322 fosse falho. Todos os players já estão aqui. O mercado se desenvolveu. E não creio que essa regra vai estimular novos investimentos na área, trazendo novos players.

Depois de 2008, durante os anos de abertura, desconheço empresa que tenha ficado sem seguro ou resseguro ou que não teve preço competitivo, em relação aos cobrados no exterior para riscos similares, para contratar seguros.

Reclamações eventuais a respeito de falta de produto não têm ligação com o resseguro, mas ao mercado primário e ao excesso de regulação e burocracia para inovar com novos produtos.

Assim sendo, as medidas recentes não resultarão em benefícios para o comprador de seguro, seja na indução de novos produtos, seja nos valores desembolsados, Hoje, o resseguro no Brasil já trabalha com taxas muito competitivas, com preços menores que a média no exterior.

A verdade é que a regra de proteção do mercado nacional não aumentou o preço final do seguro ao segurado, deu proteção ao mercado com um todo, gerou empregos e contribuiu para que o Brasil tenha hoje 16 resseguradores locais, que decidiram aportar capital e contratar pessoal especializado, criando um mercado local onde até 2007 havia somente o IRB. São 36 resseguradores admitidos registrados e 74 resseguradores eventuais. Há bastante alternativa, portanto.

O pequeno mercado de resseguro brasileiro está, enfim, mais aberto, o que é um movimento positivo e necessário, mas que — reforço — deveria ocorrer ainda mais fortemente em outros setores da economia.

Trabalho para uma empresa de capital estrangeiro, a JLT, que é a 4ª maior corretora de resseguros do mundo, mas sou brasileiro e quero um mercado local forte e promissor.

Sempre iremos nos adaptar às regras, mas o mais importante é a segurança do sistema. Mudanças muito frequentes nas regras prejudicam investidores e operadores — seja no mercado de seguros ou qualquer outro setor econômico. É  preciso segurança e credibilidade para que investimentos e operações de longo prazo tragam os frutos esperados.

*Rodrigo Protasio é CEO da JLT Re Brasil Corretora de Resseguros, empresa do grupo Jardine LLoyd Thompson Plc.




Mercado de RC e Administradores está preparado para a crise?

Gustavo Galrão, superintendente de Linhas Financeiras da Argo Seguros.
Gustavo Galrão, superintendente de Linhas Financeiras da Argo Seguros.

A crise financeira chegou e se instalou em diversos campos. Hoje, o que mais ouvimos é crise econômica, crise política, crise institucional… Até no futebol a situação está crítica. Realmente, a situação do empreendedor brasileiro não está fácil. Essa não é a melhor hora de se arriscar, principalmente em um cenário em que se tem mais a perder do que a ganhar.

Mas será que o mercado de seguro de Responsabilidade Civil e Administradores (D&O) no Brasil está preparado para esse novo cenário?

Alguns fatos contribuem para a aceleração deste ciclo, deixando-o ainda mais complicado. Dentre eles estão principalmente a continuidade do processo inflacionário, a política de aperto monetário ainda maior, com tendência de aumentar a taxa de juros básica do país ao longo do ano, evidenciando o ciclo vicioso em que se encontra a economia brasileira.

Fatores políticos e institucionais, como a perda da governabilidade pela presidente da República, desbalanceamento da política fiscal e a crise de confiança que paira na sociedade brasileira e internacional também não deixam de ser grandes influenciadores deste quadro.

No campo corporativo os impactos sentidos pelos empreendedores brasileiros são exorbitantes. Percebe-se um aumento significativo nos riscos inerentes a atividade empresarial. Muitos empresários são forçados a abandonar projetos, reduzir despesas, atrasar pagamentos, demitir funcionários e, nos casos mais graves, fechar as portas ou entrar com pedido de recuperação judicial.

Diante disso, o segmento de D&O está sendo fortemente impactado. Coincidência ou não, a sinistralidade da carteira do mercado em 2014 chegou a 53% (recorde histórico), sendo que algumas seguradoras apresentaram sinistralidade superiores a 100%. Em 2015, a sinistralidade vem se mantendo em alta, o que nos leva a um sentimento hard market.

Além do impacto decorrente deste novo cenário de risco do país, o aumento do número de investigações conduzidas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público vem contribuindo não apenas com o aumento dos casos de sinistro de D&O, mas também para o amadurecimento dos agentes deste mercado.

É notável, por exemplo, o aprimoramento da análise de risco dentro do processo de subscrição das seguradoras e o consequente endurecimento na seleção dos riscos. Os corretores, por outro lado, são cada vez mais exigidos pelos segurados para explicar o motivo do aumento nos prêmios e modificação nas condições contratuais das apólices de seguro.

Em casos mais complexos, em que a aceitação do risco é restrita pelo mercado, a colocação se torna um grande desafio, cuja solução apenas profissionais mais especializados são capazes de viabilizar.

Aos reguladores de sinistros, além do maior volume de trabalho, fica o desafio da interpretação da apólice, por exemplo, nos casos de delação premiada e acordo de leniência, cuja utilização vem sendo recorrente nos casos recentes. Se no primeiro caso o seguro claramente prevê exclusão de cobertura para confissão de culpa por parte do segurado, nos casos dos acordos de leniência reside uma maior complexidade na determinação de cobertura.

O mercado de D&O no Brasil claramente evoluiu muito na última década e já se mostra capaz de prover aos seus clientes boas soluções para os diversos riscos que os empresários e executivos brasileiros se deparam nos dias de hoje. Contudo, ainda estamos longe de representantes mais maduros, como os Estados Unidos, Inglaterra e outros países europeus. É importante ter isso bem claro para mantermos nossas mentes abertas para o aprendizado, contribuindo para o contínuo desenvolvimento deste importante mercado no Brasil.

*Gustavo Galrão é superintendente de Linhas Financeiras da Argo Seguros Brasil, subsidiária do Argo Group Internacional, e presidente da comissão de linhas financeiras da Fenseg.




A complexa arte de subscrever risco

Paula Lopes, da corretora Marsh.
Paula Lopes, da corretora Marsh.

Toda operação de seguro se constitui por meio de um contrato no qual as regras das relações entre a seguradora e o segurado são definidas. É o que chamamos de apólice. Cada seguradora estabelece as suas cláusulas neste contrato definindo limites de coberturas, franquias, garantias, riscos cobertos e não cobertos, participações obrigatórias, perdas de direitos, entre outras obrigações contratuais.

Em muitos países como no Brasil, devido à regulação local, os contratos ainda seguem parametrização única e essa padronização difere pouco o clausulado de uma seguradora para a outra. Diferentemente do que ocorre no mercado internacional e nos mercados maduros, onde os contratos de seguros são desenhados caso a caso, com coberturas personalizadas para cada negócio, para cada perfil de cliente e perfil de risco. Ou seja, um modelo taylor made.

Atualmente, cerca de 95% dos clausulados das seguradoras que atuam no Brasil segue uma parametrização única por ramo de seguro, que limita as possibilidades de desenvolvimento de coberturas adequadas para as especificidades dos riscos por atividade. Um exemplo é a apólice de risco operacional para empresas de grande porte e alta complexidade. Hoje, no Brasil, o clausulado de coberturas para os riscos de uma empresa de ferrovia, é o mesmo modelo padrão de clausulado de seguros para uma indústria siderúrgica ou de uma rede de supermercado.

Estes são alguns exemplos dentre outros que se enquadram no problema da padronização das apólices. O clausulado tem que ser elaborado de acordo com a política de gerenciamento de risco do cliente e não ao contrário.

A falta de cláusulas taylor made não só limita as coberturas, como pode gerar custos maiores para as empresas, pois em algumas situações elas têm de se enquadrar em condições contratuais não aderentes à dinâmica dos seus riscos e necessidades de gerenciamento de risco.

O que temos feito juntos às seguradoras, para oferecer apólices taylor made a diferentes perfis de indústrias, é um complexo serviço de análise para inclusão e/ou exclusão de cláusulas e adaptações em clausulados particulares.

Um trabalho de personalização em busca de soluções para riscos específicos de cada empresa. Assim, temos conseguido oferecer um serviço de ponta que segue práticas internacionais, modernas e atuais, em conformidade com as condições legais do órgão regulador brasileiro, aportando um diferencial competitivo aos clientes.

Temos novas empresas, novos modelos de negócios e novos riscos que exigem uma revisão do clausulado atual. O estabelecimento de cláusulas caso a caso, de acordo com necessidades peculiares de cada organização, é uma demanda do mundo moderno. Todas as atividades de negócios apresentam especificidade e não há modelo padrão para atender as amplas situações de riscos, principalmente no mundo globalizado.

A discussão em torno da necessidade de aperfeiçoamento e modernização do clausulado local é um pilar para o desenvolvimento do mercado segurador brasileiro e a chave para oferecermos uma abordagem diferenciada para os mais variados perfis de riscos. O nosso atual modelo não responde plenamente ao complexo trabalho de gerenciamento de risco das grandes empresas.

* Paula Lopes, superintendente de placement e da Bowring Marsh, divisão de resseguros  da corretora Marsh Brasil.




Gestão de Riscos na pauta dos conselhos de administração 

Robert Juenemann, conselheiro do IBGC.
Robert Juenemann, conselheiro do IBGC.

De extrema importância para as organizações e diretamente envolvido no planejamento estratégico, o tema gestão de riscos passou a ter reconhecida sua relevância especialmente após a crise de 2008, originada nos Estados Unidos com o estouro da bolha imobiliária. O pessimismo reverberou pelos demais países globalizados, afetando suas economias e ofertas de crédito.

Nos últimos anos, a gestão de riscos vem ganhando destaque no cenário nacional, devido à eclosão de escândalos de corrupção e até mesmo fatores naturais, como as incertezas geradas pela possibilidade da escassez de água em alguns estados brasileiros e, consequentemente, de energia. Devido a esses fatores, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) dedicou seu 3º Encontro de Conselheiros totalmente ao tema, que foi analisado sob a ótica do conselho de administração.

Por ser o principal órgão de Governança Corporativa dentro das organizações e também por ter a visão estratégica dos negócios, o conselho de administração deve analisar quais são os riscos externos aos quais a empresa está sujeita, como os relacionados à tecnologia, marca, regulação e tributação, entre outros. E, também, os riscos internos no âmbito de ameaças estratégicas da organização. Uma vez mapeados, estes riscos devem ser acompanhados preferencialmente com a ajuda do comitê executivo.

Outro ponto a ser observado é o risco embutido no planejamento estratégico das organizações, este a delinear os negócios da organização em horizonte de dois, quatro e até dez anos. Uma das principais ferramentas usadas nesse processo é a análise da Matriz SWOT. Com ela, é possível mensurar as forças (strenghts), fraquezas (weaknesses), oportunidades (opportunities) e ameaças (threats) da organização e, assim, melhor pavimentar os caminhos a serem trilhados.

Por mais que o planejamento estratégico seja pensado de forma a abranger todos os riscos, é importante que o conselho tenha a capacidade para agir com velocidade em situações inusitadas. O assunto riscos, fazendo parte da agenda do conselho, tende a resultar em uma reação mais célere e eficaz.

Especial atenção também tem sido dada aos riscos cibernéticos, considerados relativamente novos para as organizações brasileiras. A importância de se ter manter as informações eletrônicas das companhias em sigilo também é uma forma de preservar as ações estratégicas e evitar que dados relevantes sejam divulgados de forma incorreta para o mercado e stakeholders. Por ser estratégico, o assunto também deve constar na pauta das reuniões do conselho.

Nesse cenário, entende-se que colegiado deve ter o poder de avaliar variada gama de assuntos, a fim de sempre preservar o valor da organização. Por isso, é essencial que as reuniões do conselho de administração baseiem suas decisões com a informações precisas e que suas decisões sejam passadas para a gestão de forma equânime e clara, além de contarem com relatórios explicativos que permitam uma tomada de decisão ágil e eficiente.

*Robert Juenemann é conselheiro de administração do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).




Gestão de risco, seguro e competitividade

Angelo Colombo, CEO da Allianz para América do Sul.
Angelo Colombo, CEO da Allianz para América do Sul.

O desenvolvimento da gestão de riscos no Brasil é uma boa notícia não só para as empresas, mas também para o mercado de seguros.

No caso das empresas, a explicação é simples. Companhias que se preocupam em gerir seus riscos de uma maneira efetiva tendem a ser mais eficientes. A correlação positiva se deve ao fato que riscos bem administrados representam uma menor possibilidade de interrupção da atividade da empresa. E isso é algo importante porque ninguém quer perder mercado para concorrentes devido às suas próprias falhas operacionais.

Para as seguradoras, a importância de uma gestão de risco eficiente por parte de seus clientes tampouco pode ser minimizada. À primeira vista, pode parecer uma afirmação contraditória. Afinal, uma das características de um programa eficiente de gestão de riscos é que a empresa busca transferir a menor quantidade possível de riscos para o mercado de seguros.

Mas é preciso lembrar que o seguro não é uma ferramenta à disposição das empresas para se livrar dos seus riscos operacionais a fim de não ter mais que se preocupar com eles. Na verdade, trata-se de uma opção que o cliente tem de transferir apenas aqueles riscos que não deseja manter na sua operação. Para uma seguradora global que lida com áreas complexas, como a Allianz, é importante que o cliente seja o principal interessado em reter os seus riscos.

Por exemplo, muitas empresas transferem para o mercado riscos como incêndios ou terremotos, que apresentam baixa frequência, mas causariam elevados prejuízos caso viessem a ocorrer. É uma prática consagrada que, aliada a medidas de prevenção e de mitigação do potencial impacto de tais eventos, auxilia a empresa a otimizar sua capacidade financeira ao mesmo tempo em que assegura sua sobrevivência no caso de uma catástrofe.

Esse, no entanto, não é o caso dos riscos do dia-a-dia da operação empresarial, que precisam ser cobertos não pelo seguro, mas pela manutenção criteriosa por parte das próprias companhias. De fato, o cliente de que as seguradoras mais gostam é aquele que atua como se não fosse segurado, e por isso toma todas as medidas necessárias para evitar que sua operação seja afetada por eventos inesperados.

Hoje, porém, o mercado segurador vive um ciclo de baixa, em que a abundância de capacidade pressiona os preços para baixo. Com isso, o cliente pode considerar atraente a ideia de transferir para o mercado até mesmo aqueles riscos que não costuma transferir.

É uma opção que deve ser analisada com muito cuidado. Quando uma empresa decide transferir um risco sem investir na sua mitigação, ela pode comprometer sua capacidade futura de recorrer ao mercado de seguros. Isso porque, caso tenha uma perda, o mercado mais tarde pode recusar a tomar novamente este risco. Além disso, o cliente terá perdido uma oportunidade de criar uma cultura de gestão de risco, o que torna mais difícil o posterior saneamento.

A atual conjuntura também alimenta a possibilidade de exageros no lado oposto da equação. Infelizmente, ainda é comum que empresas vejam o seguro como um custo supérfluo. Em tempos em que a economia se desacelera, isso significa que muitos administradores podem ver no programa de seguros um candidato a sofrer cortes de gastos.

Tal decisão seria no mínimo discutível, pois é justamente quando a empresa está trabalhando sob pressão financeira que o impacto de uma perda inesperada tende a ser mais crítico. Ainda mais porque este tipo de postura é mais comum entre as organizações de pequeno e médio porte, que são justamente as que mais estão expostas a desaparecer caso sofram um grande sinistro.

A calibragem das reais necessidades de seguro é um importante passo para otimizar a competitividade da empresa e garantir sua sobrevivência no longo prazo. E isso se consegue por meio da gestão de riscos. Na verdade, nós observamos no mercado de seguros que os clientes que conseguem mais êxito em seus segmentos em geral têm ótimo gerenciamento de riscos.

Ainda há portanto um grande trabalho de conscientização a ser feito para ajudar o setor empresarial brasileiro a desfrutar destas vantagens pela implementação de programas efetivos de gestão de riscos. É um processo trabalhoso, mas que vai trazer importantes resultados no longo prazo não só para as empresas, mas para toda a economia brasileira.

*Angelo Colombo é CEO para a América do Sul da Allianz Global Corporate & Specialty.